Celso Moretti, presidente da Embrapa, abordou as grandes tendências para o futuro da agricultura brasileira durante o 19º Congresso Brasileiro do Agronegócio, promovido pela Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), na segunda-feira (3). Agricultura digital, bioeconomia, edição genômica e sistemas integrados de produção foram os destaques apontados pelo pesquisador, que também chamou a atenção para o desafio da conectividade no campo.
Moretti fez a apresentação de abertura do painel “O agro e a nova dinâmica econômica, social e ambiental”. O debate painel teve como questão condutora: “o que será este mundo pós-pandemia e qual será o papel do agro?”. Participaram da discussão José Roberto Mendonça de Barros, sócio-diretor da AMB Associados, Luiz Felipe Pondé, filósofo e colunista do jornal Folha de S. Paulo e André Guimarães, diretor-executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), com moderação de William Waack, jornalista e apresentador da CNN Brasil.
O presidente da Embrapa expôs as tendências da agricultura e seu contexto no Brasil. Ele destacou que o agronegócio é um dos setores mais pujantes da economia nacional, responsável por cerca de 22% do PIB, gerando um em cada cinco empregos e quase metade de todas as exportações. “Apesar da pandemia do coronavírus, alcançamos uma safra de grãos de mais de 251 milhões de toneladas. O Brasil ficou em primeiro lugar na produção de soja, e passamos de mais de 100 milhões de toneladas de milho. O agro brasileiro foi um dos poucos setores que apresentaram resultados positivos no primeiro trimestre”, disse.
A primeira tendência destacada em sua apresentação é a agricultura digital e a necessidade de conectividade no campo, “determinante para o crescimento da produção brasileira nos próximos anos.”
Para ele, “é uma área que cresce fortemente, com o uso de sensores, drones, internet das coisas, apesar da dificuldade brasileira de conectividade”. Moretti chamou a atenção para o fato de que, de acordo com dados recentes do IBGE, 72% das propriedades rurais ainda não têm conectividade. Segundo o presidente, esta é uma limitação que implicará em desafios para o crescimento da produção brasileira nos próximos anos.
Outra tendência é a bioeconomia ou economia de base biológica. “O Brasil, por ser um país que reúne uma das maiores biodiversidades do mundo, tem uma fantástica oportunidade de geração de emprego, renda e divisas a partir da bioeconomia”, disse. Como exemplo recente, destacou o Biomaphos, que reduz a importação de adubo fosfatado. Também falou da descoberta de cientistas da Embrapa, em expedição nos rios da Amazônia, de microrganismos que poderão ser utilizados como biopesticidas ou em outros tipos de indústrias.
A terceira tendência apontada pelo presidente da Embrapa é a edição genômica de plantas. “O uso de tesouras biotecnológicas para adaptar a soja a condições de seca ou mesmo à resistência de pragas ou doenças é uma realidade”. A última tendência que destacou são os sistemas integrados de produção. “A ILPF no Brasil já ocupa uma área de 15 milhões de hectares, possibilitando que o país coloque no mercado o conceito de Carne Carbono Neutro”, disse.Ao final de sua apresentação, Moretti enfatizou que, com a covid-19, acentuou-se a preocupação mundial com a sanidade dos rebanhos. Ele citou a peste suína africana como um dos desafios recentes. “Sanidade dos rebanhos, segurança dos alimentos consumidos, saúde humana e sustentabilidade dos sistemas produtivos são preocupações que se acentuaram com a pandemia”, afirmou.
“O Brasil possui uma série de políticas públicas que contribuem para a sustentabilidade ambiental. Há o Renovabio (o estímulo à produção sustentável de biocombustíveis), o Plano ABC, o Código Florestal, que limita a expansão da área cultivada". Para Moretti, enfrentar a batalha de comunicação no exterior e entender como esse novo consumidor, que tem mais acesso a informações, vai enxergar esse mercado dos produtos brasileiros em todo o mundo será um dos desafios para o agronegócio.
Ministra destaca papel da Embrapa
A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, também participou do evento. Ela defendeu a sustentabilidade do agronegócio brasileiro. “O Brasil é o único país do mundo que consegue produzir e preservar. Nossa pecuária vem crescendo muito sem desmatar”, disse ela na abertura do congresso.
Tereza Cristina explicou que, após a pandemia, o mundo será ainda mais exigente em sanidade e sustentabilidade. “Precisamos exercitar cada vez mais a sustentabilidade no agro brasileiro. Por isso, tivemos a preocupação de trazer no Plano Safra 2020/21 várias linhas com recursos exclusivos à sustentabilidade”, afirmou. Ela destacou o papel da Embrapa, que fornece tecnologias para o produtor evoluir nas práticas agrícolas. “Nenhum país tem tecnologia e pesquisa de ponta como a que a Embrapa oferece”, enfatizou.
A ministra abordou ainda a diversificação da pauta exportadora do agro brasileiro, destacando as mais de 70 aberturas de mercado em sua gestão. “Estamos diversificando a pauta exportadora para alimentos como gergelim e grão-de-bico e aumentando a produção nacional de alimentos como trigo”, exemplificou.
O mundo pós-pandemia
Para José Roberto Mendonça de Barros, um dos debatedores do terceiro painel, num mundo pós-pandemia não haverá tantas novidades, mas diversos aspectos serão acentuados. “As pesquisas mostram que as pessoas estão mais atentas a uma vida mais simples, à origem das coisas e a um contato mais direto com a natureza. Como consumidores, as pessoas estarão ligadas à qualidade dos alimentos, à sua origem, a aceitar mais facilmente a rastreabilidade dos produtos. E, como trabalhadores, a percepção é que nós teremos uma aceleração da digitalização em todas as áreas”, afirmou.
O executivo destacou que a agricultura brasileira é sustentável. “Temos um conjunto de tecnologias que permitiu o aumento contínuo de produtividade, o que gera resultado econômico. Desde sempre nosso agro disputa mercado no exterior com sucesso, sendo o mais competitivo do mundo e sem subsídios”.
Segundo André Guimarães, do Ipam, embora o Brasil tenha diminuído seu crescimento em decorrência da pandemia, o agro segue em alta. Por outro lado, ele defendeu que é preciso rever o modelo de desenvolvimento. “Ou conseguimos resolver a equação do clima ou não seremos sustentáveis. A dependência das chuvas para a agricultura, por exemplo, nos torna dependentes das florestas tropicais. Por isso precisamos investir em tecnologias, melhores sementes e também em reconstruir nossa reputação, mostrando para o mundo que estamos unidos e não polarizados. O meio ambiente não é externalidade para o agro, é um aspecto intrínseco para a produção no Brasil. Sem a Amazônia em pé não teremos reputação, atratividade de capitais e chuvas para a produção”, afirmou.
Já o filósofo Luiz Felipe Pondé fez uma análise histórica da pandemia. “Daqui a cinco anos ninguém se lembrará desta pandemia, assim como meses atrás ninguém se lembrava da gripe espanhola”, disse. Para ele, a pandemia evidencia o que já é tendência mundial: um consumidor mais exigente, preocupado com o meio ambiente, e a digitalização dos negócios, realidades postas antes da covid-19.
O congresso da Abag foi realizado de forma virtual e reuniu cerca de 8 mil participantes.
Secretaria de Inteligência e Relações Estratégicas (Sire)
Comentários
Postar um comentário