Pioneirismo em fazer três safras é revolução da agropecuária brasileira



O sistema de cultivo composto pelo plantio da soja na safra de verão seguido do milho na segunda safra, predominante nas principais regiões produtoras do Brasil, foi tema de seminário durante a 12ª Semana de Integração Tecnológica, realizada pela Embrapa Milho e Sorgo (Sete Lagoas, MG). Com o início da então chamada “safrinha” ainda na década de 1990, que hoje supera a principal safra de milho, vê-se a cada ano a antecipação do plantio da soja, com cultivares cada vez mais precoces, na busca da curta janela do final do período chuvoso para se plantar o cereal. Hoje já se planta a leguminosa no início de setembro, respeitando o vazio sanitário, às vezes quando nenhuma gota de água ainda caiu no solo.

O motivo é estratégico e vem sendo responsável, como enxerga o produtor rural e engenheiro agrônomo Ricardo Arioli da Silva, como a revolução da agropecuária brasileira. Associado às duas safras, Arioli ainda faz mais uma, plantando milho destinado à silagem com braquiária após a soja e engordando gado, permitindo um faturamento que, segundo ele, supera o dobro do obtido apenas com a cultura da leguminosa. Arioli se diz fã do Sistema Santa Fé ou da Integração Lavoura-Pecuária, que permite o consórcio do milho com uma espécie forrageira, garantindo alimento para o gado que vem em seguida. “Após a colheita da silagem, entramos com o gado pastejando, que fica até setembro e sai para o abate”, explica.

“Essa tecnologia não existe em nenhum outro lugar do mundo. Talvez possamos ver na África daqui a alguns anos. Nos Estados Unidos, nosso principal concorrente na produção agrícola, os produtores têm que esperar o solo descongelar para fazer apenas uma safra. No Brasil fazemos três. Isso é sustentabilidade”, resume o produtor, que possui uma propriedade de quase três mil hectares no município mato-grossense de Campo Novo do Parecis. Na visão dele, o Brasil tem tudo em mãos, na atual conjuntura, para se tornar o maior exportador de soja, milho e carne bovina para a China, com oportunidades também para a carne suína e a de aves.

“As oportunidades estão aí. Se aproveitarmos bem o momento, nos consolidaremos nesta primeira posição”, enxerga. Nesse contexto, o produtor reforça novamente o papel estratégico do sistema ILP como tendência irreversível na agropecuária brasileira. “Cai como uma luva para tudo o que o Brasil já tem. Em Mato Grosso, por exemplo, temos o maior rebanho de gado bovino, sendo que a soja vai entrar nas áreas de pastagens porque o desmatamento não é nem mais possível nem mais aceitável. Isso vai melhorar para a pecuária, diminuindo a idade de abate dos animais e trazendo outros benefícios”, antecipa Ricardo Arioli.

Conjuntura do milho na produção do etanol


O produtor destaca que entre as culturas semeadas na segunda safra, o milho é a mais promissora. O Estado de Mato Grosso é o maior produtor de etanol derivado do cereal no Brasil, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). “Por conta de ser o milho mais barato do Brasil, e eu brinco que é até o milho mais barato do mundo, diminui muito o custo de produção do etanol. Apesar de não ser tão eficiente quanto a cana, a produção de etanol a partir do cereal gera o DDG (ou grão de destilaria seco), que é um subproduto proteico que pode ser usado na alimentação do gado. Então, nesse momento, o milho seria a cultura mais viável para a segunda safra”, afirma.

Palhada no solo é fundamental, defendem pesquisadores


O pesquisador Emerson Borghi, da área de Fitotecnia da Embrapa Milho e Sorgo, chama a atenção para um fato muito comum na agricultura brasileira que, infelizmente, destoa da preocupação do produtor Ricardo Arioli em manter o solo coberto. “Uma boa safrinha de palha é necessária para aumentar as chances de se alcançar uma boa produtividade na safra. A palha diminui a velocidade de evaporação da água do solo e diminuiu os efeitos de um veranico, por exemplo. Quanto maior a quantidade de cobertura, maior a persistência da palhada”, explica. “Construir o perfil do solo é garantia de mais armazenamento de água e nutrientes”, conclui. “No Mato Grosso não é possível mais não trabalhar com a palhada. É uma riqueza que o produtor tem”, endossa o agricultor Ricardo Arioli.

Para Álvaro Vilela de Resende, pesquisador da área de Fertilidade de Solos da Embrapa Milho e Sorgo, numa espécie de escala que deve ser seguida pelos produtores em busca de estabilidade de produção, a matéria orgânica ocupa lugar de destaque. “Com a intensificação vegetativa, temos mais nutrientes circulantes no sistema. Isso garante menor perda de elementos essenciais, como nitrogênio, fósforo e potássio, e maior eficiência”, explica Resende. “O produtor tem que ficar atento porque é difícil aumentar os níveis de matéria orgânica no solo, mas é muito fácil perder”, avalia. “O agricultor ganha estabilidade de produção quando o saldo disponível de nutrientes e de matéria orgânica é suficiente”, pondera.

Nesse balanço entre exigência de água e nutrientes e a oferta desses elementos, duas substâncias ainda merecem destaque no crescimento das raízes das culturas, segundo o pesquisador. “O cálcio tem papel preponderante para o sistema radicular. O fósforo também estimula a ramificação das raízes, permitindo que elas se aprofundem mais. A oferta desses nutrientes deve ser tratada como prioridade entre os agricultores que desejem alcançar produtividades crescentes”, explica Resende. “Sistemas intensivos requerem fertilidade construída e a busca por boas práticas como calagem, gessagem e adubações corretivas deve ser prática comum entre os agricultores”, conclui.

Guilherme Viana (MTb 06566/MG)
Embrapa Milho e Sorgo

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