Apesar de a palma de óleo ou dendê (Elaeis guineensis, Jacq.) ainda ser uma cultura oleaginosa não recomendada para plantio no Cerrado do Brasil Central, de acordo com o zoneamento agroecológico da cultura, pesquisadores têm buscado identificar e mensurar os fatores que podem viabilizá-la na região – entre eles, a questão hídrica, já que o dendezeiro precisa do solo constantemente úmido para se desenvolver, enquanto o bioma apresenta um período de seca de seis meses ao longo do ano. Nesse sentido, uma pesquisa da Embrapa Cerrados (DF) estabeleceu os principais parâmetros para o manejo da irrigação da cultura: quando e o quanto colocar de água.
Se na região Norte do País, sobretudo no Pará, maior estado produtor, onde o dendezeiro é tradicionalmente cultivado, a questão hídrica não é um problema devido ao clima úmido, no Cerrado a irrigação é necessária devido ao longo período de déficit hídrico, como explica o pesquisador Jorge Antonini. Ele é líder de um projeto de pesquisa que avaliou o momento de irrigar a cultura e a quantidade mínima de água necessária ao desenvolvimento das plantas em condições de clima tropical de savana.
Para avaliar o momento da irrigação, foi montado um experimento em Planaltina (DF) com quatro tratamentos, cada um com uma taxa diferente de esgotamento da água disponível no solo – perdas de 20%, 40%, 60% e 80%. “Avaliamos o quanto de água o solo poderia perder sem comprometer a produção de dendê. Com perdas de até 60% da água disponível no solo, o desempenho da cultura foi semelhante. Então, determinou-se que esse é o momento de irrigar”, diz o pesquisador.
Já para definir a quantidade de água a ser resposta pela irrigação, correspondente ao que a planta consumiu no dia, a pesquisa buscou estabelecer um índice – o coeficiente de cultura (Kc)*. Conhecer o Kc é importante porque, a partir dele e da evapotranspiração de referência (consumo hídrico estimado da região em mm/dia) medida numa estação meteorológica local, é possível calcular a quantidade de água consumida pela planta no dia.
Até então, a literatura científica fornecia somente o Kc para o primeiro ano de plantio do dendezeiro, equivalente a 0,75. No caso das plantas avaliadas no experimento, foi verificado que o Kc se manteve em 1,1 a partir do quarto ano de plantio, quando o dendezeiro normalmente inicia a produção de frutos.
Foram utilizadas quatro cultivares da Embrapa no experimento, todas do tipo tenera – BRS C2501, BRS C1001, BRS C2528 e BRS C2301, desenvolvidas pela Embrapa Amazônia Ocidental (Manaus, AM). Segundo Antonini, as cultivares BRS C2501 e BRS 2301 apresentaram melhor adaptação às condições climáticas da região.
Desempenho produtivo
O estudo também avaliou o desempenho produtivo do dendezeiro nas condições de Cerrado. No primeiro ano de produção, a produtividade média foi de 12 t/ha/ano de cachos de frutos frescos, bem superior à produtividade na Amazônia no mesmo período, em torno de 4 a 6 t/ha/ano. No segundo ano, alcançou média de 19,5 t/ha/ano. Enquanto no pico de produção (a partir do 8º ano) a média amazônica é de cerca de 20 t/ha/ano nos plantios comerciais em condições ideais de manejo, a expectativa é de que no Cerrado a produtividade média alcance 27 t/ha/ano.
No Cerrado, a pesquisa observou que as plantas apresentam maior diâmetro de caule, mas crescem menos em altura (36 a 37 cm/ano, em média) que na Amazônia (45 cm/ano, em média) e têm folhas menos compridas. “Assim, é possível ter maior densidade de plantas por hectare. Enquanto na Amazônia se planta em torno de 143 plantas/ha, no Cerrado pode-se ter 180 plantas/ha, o que otimiza o uso da terra e aumenta a produtividade”, observa o pesquisador.
Ele ressalta que o trabalho definiu o primeiro manejo a ser feito na cultura em condições climáticas de Cerrado. “Demos o pontapé inicial quanto ao correto manejo da irrigação, com parâmetros para clima tropical de savana. Com o tempo, ele pode ser refinado à medida que o processo produtivo for sendo inserido na região”, aponta.
Ainda não há plantios comerciais de dendezeiro no Cerrado, mas os primeiros resultados de produtividade atestam o potencial de implantação da cultura na região. “É preciso haver indústrias processadoras próximas às lavouras, no máximo 50 km, porque o cacho precisa ser colhido e processado em até 24 horas. Por isso, seria interessante que ela esteja no meio rural como um núcleo de produção de uma associação ou cooperativa, por exemplo”, argumenta Antonini.
Sobre o dendê
O dendezeiro é uma planta originária do oeste da África e pode produzir pelo menos até o 25º ano do plantio. Da polpa do dendê é extraído o óleo de palma, principal fonte de óleo comestível do mundo, que contém oleína (óleo líquido usado em alimentos como o azeite de dendê e na indústria de cosméticos) e a estearina (de composição pastosa, é empregada na fabricação de margarinas e da manteiga de cacau e na fritura de chips). Da amêndoa se extrai o óleo de palmiste, usado na fabricação de cosméticos. Em média, o óleo de palma extraído de um cacho representa 21% de seu peso, enquanto o óleo de palmiste equivale a 1,5% do peso.
De acordo com a Associação Brasileira de Produtores de Óleo de Palma (Abrapalma), o Brasil produz cerca de 450 mil toneladas anuais de óleo de palma. O Pará é o estado que concentra a maior parte da produção brasileira, cerca de 85%, em mais de 200 mil hectares. No mundo, a plantação da palma de óleo envolve cerca de 5 milhões de famílias de agricultores em 44 países nas Américas Central e do Sul, África, Ásia e Oceania. Os maiores produtores são a Indonésia e a Malásia.
* O Kc foi determinado pela razão entre a evapotranspiração da cultura (ETc - evaporação da água do solo mais a transpiração das plantas), medida no experimento, e a evapotranspiração de referência (ET0 - consumo hídrico de referência para a região), medida na estação meteorológica do centro de pesquisa – ambas em mm/dia.
Breno Lobato (MTb 9417-MG)
Embrapa Cerrados
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