Artigo - O protagonismo do Brasil na produção mundial de pescado


Já é tradição para o setor pesqueiro, a publicação bianual do “Estado Mundial da Pesca e Aquicultura” (“The State of World Fisheries and Aquaculture”, disponível aqui. Carinhosamente apelidado de SOFIA, seu conteúdo apresenta dados recentes da estatística pesqueira mundial. A publicação está sob responsabilidade da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), que coleta e organiza relatórios técnicos de diversos países, obtendo um retrato atual sobre a pesca e aquicultura.

Em versões anteriores, o documento baseava-se principalmente na estatística pesqueira, mas hoje trata de assuntos relacionados às mudanças climáticas, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, relações trabalhistas, questões de gênero dentro do setor, segurança alimentar e programas de apoio a países em situação de vulnerabilidade. A versão de 2020 é focada principalmente na sustentabilidade, temática intrinsicamente relacionada ao Brasil que, desde a Eco-92, participa de discussões sobre produção de alimentos com sustentabilidade e preservação ambiental. Porém, os desafios para o avanço desta agenda são imensos, a começar pela conservação de zonas costeiras e recursos pesqueiros, compromisso assumido pelo Brasil e por diversos países do mundo pela Agenda 2030 e reforçado pelo lançamento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis estabelecidos pela ONU (Organização das Nações Unidas).

Qual o papel do Brasil na produção mundial de pescado?

O Brasil já foi considerado o país com maior potencial para o desenvolvimento da pesca e aquicultura. Hoje, ocupa apenas a 13ª posição na produção de peixes em cativeiro, e é o 8º na produção de peixes de água doce. Segundo a FAO, desde 2014 não há estatística pesqueira oficial no Brasil e os dados são obtidos por levantamentos realizados pela instituição e seus parceiros.

No entanto, o SOFIA 2020 pode nos orientar sobre qual direção tomar no cenário da aquicultura e pesca: a retomada de um programa nacional de estatística pesqueira como forma de conhecer nossa capacidade produtiva e seus desafios; maior investimento em pesquisa e tecnologia para tornar a pesca extrativista e a aquicultura mais sustentáveis, eficientes, competitivas, rentáveis e seguras; estabelecimento de políticas para preservação da nossa biodiversidade a fim de garantir a continuidade da vida aquática, das nossas águas e de tudo com que ela se relaciona; e por fim, conscientizar a população da importância do pescado na economia, na saúde, na cultura e na vida Brasileira.

A produção mundial e a importância do pescado na alimentação

Em 2018, foram produzidas 179 milhões de toneladas de pescado no mundo, com valor estimado em US$ 401 bilhões. Dentre os países produtores de pescado, a China ganha destaque e lidera o ranking, sendo responsável por 35% da produção total. Esse montante supera a produção total da Ásia (34%), Américas (14%), Europa (10%), África (7%) e Oceania (1%).

Aproximadamente 87% da produção (156 milhões de toneladas) foi destinada ao consumo humano, o que representa uma mudança significativa no uso do pescado desde a década de 1960, quando boa parte era utilizado na produção de farinha e óleo de peixe. Hoje, esses produtos provêm de subprodutos do processamento do pescado.

Esse melhor aproveitamento reflete no maior consumo per capita de pescado pela população mundial, que chegou a 20,5 kg/pessoa/ano em 2018. O pescado apresenta elevada importância na segurança alimentar de muitas populações. Estima-se que seu consumo represente 17% da ingestão de proteína animal pela população mundial. Em países como Bangladesh, Camboja, Gana, Indonésia, Serra Leoa, Sri Lanka e pequenos países insulares, o produto da pesca extrativista representa até 50% da proteína animal consumida.

Falando em pesca, um dado curioso: após anos de estagnação, a FAO constatou um aumento em 5,4% na captura de espécies marinhas, totalizando 96,4 milhões de toneladas de pescado em 2018. Esse aumento, em parte, foi devido a pesca da anchoveta (Engraulis ringens) em áreas próximas ao Chile e Peru. No entanto, as aparências enganam, pois, o monitoramento dos estoques pesqueiros, indica que as espécies marinhas apresentam contínuo declínio. Em 1974, 90% dos estoques estavam classificados como “biologicamente sustentáveis”. Em 2017, esse percentual caiu para 65,8%, sendo que boa parte desse montante está no limite máximo de captura, podendo entrar em sobrepesca a qualquer momento.

Os maiores “pescadores” globais foram: China (15%), Indonésia (7%), Peru (7%), Índia (6%), Rússia (5%), Estados Unidos (5%) e Vietnã (3%).Em termos de espécies, a principal captura foi de anchoveta (7 milhões de ton.), seguida pelo bagre Alaska pollock (3,4 milhões de ton.) e o bonito (Katsuwonus pelamis, 3,2 milhões de ton.).

A aquicultura, ou produção de organismos aquáticos em cativeiro é composta principalmente por pescado oriundo de águas interiores. Em resumo, 54,4 milhões de toneladas representam a produção de peixes (47 milhões espécies de água doce e 7,3 milhões espécies marinhas); 17,7 milhões são moluscos e 9,4 milhões crustáceos.

As principais espécies produzidas ainda são as carpas (carpa capim – Ctenopharyngodon idellus; carpa prateada – Hypothalmichthys molitrix) e a tilápia nilótica (Oreochromis niloticus). O salmão (Salmo salar) ocupa apenas a nona posição no ranking. Outras espécies também merecem destaque na aquicultura, como o camarão branco do Pacífico (Penaeus vannamei), os moluscos (ostras, vieiras e mariscos), além das algas marinhas como a Laminaria japônica, Euchema spp., Gracilaria spp. e Nori ou Porphyra spp. (usada em sushis), que ganham cada vez mais espaço no setor.  

Com relação às formas de comercialização do pescado, 44% são vendidos vivos, frescos ou resfriados, 35% congelados, 11% processados e 10% curados e salgados. Isso reflete a baixa tecnologia aplicada na conservação e comercialização do pescado, bem como a preferência que países consumidores como Portugal, Japão e Noruega pelo produto na sua forma mais saudável e fresca.

Em termos de continentes produtores, a Ásia é o principal, responsável por 42% da aquicultura mundial, seguida pela África (17,9%), Europa (17,7%), Américas (15,7%) e Oceania (12,7%). Se focarmos na produção de peixes de água doce, a Ásia domina com 89% da piscicultura mundial. Os principais países produtores são: China, Bangladesh, Chile, Egito, Índia, Indonésia, Noruega e Vietnã.

Vale ressaltar que em 2018, 39 países produziram mais pescado em cativeiro do que pela pesca extrativista. A China lidera esses países, pois principalmente na Ásia essa tendência mostra-se como futuro na produção de pescado. No entanto, África, Américas e Europa ainda dependem da pesca extrativista para obter sua produção.

 

Fabíola Fogaça (pesquisadora)
Embrapa Agroindústria de Alimentos

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